segunda-feira, 27 de maio de 2013

Demónios

Demónios por Fiódor Dostoiévski

Numa Rússia czarista, fechada, conservadora, repressiva, sufocada pelo jugo simultâneo da aristocracia no plano económico e da Igreja Ortodoxa ao nível das ideias, uma geração jovem, educada e desocupada cresce sem valores nem horizontes, sendo atraída por ideologias terroristas cujo único propósito declarado é destruir os pilares da sociedade que odeiam.

Em tensão encontram-se três ideologias que se combatem. A pedra de toque as funda e distingue é a relação com Deus. A ideologia conservadora, encontra a sua justificação na Igreja Ortodoxa, cuja fé professa na plenitude. Os liberais da primeira geração, gradualistas e reformadores, cuja grande obra foi a libertação dos camponeses do regime de servidão, simultâneamente opostos à tirania mas receosos de grandes transformações sociais, eram tementes a Deus mas críticos da Igreja. Os niilistas ateus, desiludidos pelas reformas que pouco ou nada mudaram e rejeitando todos os valores morais, que vêm no caos e na destruição a única forma de actuação. Esta é o confronto que este livro nos conta, através das suas personagens, cada uma delas uma encarnação viva dos três grupos em liça.


Um livro actual que comporta muitas reflexões úteis num Portugal em crise em que as novas gerações estão a ser empurradas para posições niilistas pela incapacidade das elites de hoje de construir uma sociedade equilibrada e justa.

quinta-feira, 2 de maio de 2013

Gente Pobre

Gente Pobre por Fiódor Dostoiévski


Gente Pobre foi a primeira novela de Dostoiévski e um grande sucesso editorial. Considerado um dos primeiros romances sociais russos a história exibe claros contornos naturalistas mesclados com uma sátira mordaz. OS pobres aqui retratados são, de facto, a classe média baixa do funcionalismo público do czarismo novecentista que vive de uma forma muito contida, sempre a beira da completa miséria. Qualquer despesa extra, umas simples solas nas botas, um capote roto que tem de ser substituído, e as finanças pessoais desequilibram-se e a fome e o frio aliam-se para desferir o golpe de misericórdia fatal.
 
Escrita na forma de uma troca de correspondência entre um funcionário público de meia-idade e uma jovem sua prima e vizinha, a novela desvenda-nos as dificuldades materiais dos personagens mas acima de tudo a sua psicologia, os seus medos e esperanças. A valorização do aprumo acaba por traduzir-se em vergonha pela roupa coçada e sem botões, a importância atribuída ao esmero no trabalho esvai-se no erro grosseiro, o gosto pela vida intelectual é inquinada pela troça literato.

Sempre com uma aguda e dolorosa consciência destes factos, que descreve de forma satírica, ridicularizando-se, o personagem, masculino desequilibra-se na vida, vê aproximar-se a desgraça, balanceia entre a recuperação e a miséria e salva-se, como tanta gente pobre, graças ao acaso de uma esmola do chefe e ao casamento da prima com um homem abastado.