terça-feira, 30 de maio de 2023

O Navio Night


 

O Navio Night por Marguerite Duras

 

Reúnem-se aqui um conto e a trilogia de Aurélia Steiner obras que foram depois transpostas para o cinema pela própria autora assumindo assim também a função de realizadora.

 

O Navio Night expõe a insuportável tensão entre o desejo e a distância que separa os dois jovens apaixonados e que os impele para um longo, doloroso amor platónico à beira da loucura. Um fosso essencialmente social, psicológico e sanitário separa os amantes que permanecem unidos por um fino fio de cobre.

 

A trilogia de Aurélia Stein revela-nos uma atmosfera terrível em que a desgraça une passado e presente, homem e mulher, o desejo e a morte, numa rememoração histórica da mais sangrenta catástrofe europeia.

 

Uma bela prosa poética, erudita, metafórica que nos absorve, envolve e submerge num turbilhão de emoções e acontecimentos e nos obriga a viver a angústia dos protagonistas e a olhar de frente os cenários que os envolvem. Um estilo em frases e parágrafos curtos, enxutos mas simultaneamente insubstituíveis e necessários.

Marguerite Duras (1914-1996) escritora e realizadora francesa, foi a vencedora do Prémio Goncourt de 1984 pela sua obra O Amante.

domingo, 21 de maio de 2023

Vejam como dançamos


 

Vejam como dançamos de Leila Slimani

 

Leila Slimani traz-nos Marrocos descritos pela saga de uma família de grandes agricultores ricos, que prosperam à sombra do regime colonial primeiro e depois no período de repressão durante o reinado de Hassan II. Um país dual, agrícola, em que os assalariados rurais vivem mergulhados na miséria, com uma indústria de conservas de sardinhas emergente e o turismo a espreitar como promessa futura.

 

Os estudos em França, a proximidade ao poder, a repressão feroz e selvagem, as comunidades hippies estrangeiras, as criadas envolvem a família Belhaj numa trama muito simples, sequencial e sem surpresas. A linguagem direta torna o texto de leitura fácil e rápida.

 

Um livro de sabor autobiográfico em que a autora recorre a memórias da sua própria família, uma família plurinacional, bicultural e bilingue entre o francês, que falam entre si as elites, e o árabe com que comunicam com as restantes classes sociais.

 

Leila Slimani (n. 1981) é uma escritora franco-marroquina. Venceu recentemente o Prémio Goncourt pela sua obra Canção Doce. Vive atualmente em Portugal. Vários dos seus livros estão traduzidos para português.

sábado, 6 de maio de 2023

Platero e eu

 

Platero e eu de Juan Ramón Jiménez

O campo andaluz na sua simples placidez colorida e terna sob um céu azul cintilante - a natureza em todo o seu cálido fulgor, a tranquila meditação à sombra de árvores frondosas, a serena comunhão com a natureza, a maravilhada observação dos animais e insetos que povoam as zonas agrícolas.

 

Juan Ramón Jiménez maravilha-nos com a sua escrita em prosa poética, comove-nos com as descrições brandas, exatas e perspicazes, do mundo rural e das suas personagens. O seu companheiro, Platero, um burro “pequeno, peludo, suave, tão macio, que dir-se-ia todo de algodão”, acompanha o personagem e os textos são lhe dedicados.

 

As imagens surpreendem e encantam – “entra no regato, pisa a lua e fá-la em pedaços”, “no trigal amarelo e ondulante, gotejado do sangue das papoilas, que Julho coroava de cinza”, “aprisionado voo policromo”, “como ri em paz, clara e fria a nora do horto, como voam, na luz derramada as abelhas atarefadas em volta do alecrim verde e malva, róseo e dourado pelo sol que ilumina a colina”.

 

Seria um livro completamente maravilhoso não fossem dois espessos defeitos: i) o racismo contra os ciganos e contra os portugueses, os primeiros acusados de ladrões e os segundos também; ii) a cegueira, onde vê calma, paz, harmonia é na verdade o campo dos latifúndios e do infortúnio dos trabalhadores que aliás descreve como morrendo de tuberculose, como não tendo Natal, como andando descalços e esfarrapados.

  

Juan Ramón Jiménez (1881-1958), poeta espanhol, foi Prémio Nobel em 1956. Opositor ao regime franquista exilou-se nos Estados Unidos e viveu em Porto Rico, onde morreu.