A Imperfeição do presépio por António Manuel Marques
Uma vida, dura e sofrida, de uma mulher recordada pela
própria olhando as fotografias de família que guarda numa caixa de cartão.
A lida rude do campo, a migração para a cidade, o trabalho a
dias, a sobrevivência nas barracas sem água nem luz, os filhos que vão
nascendo, o marido alcoólico mas trabalhador, as desgraças que lhe batem à
porta, tudo é recordado com nostalgia e um certo orgulho dos sobreviventes que com
trabalho, sofrimento e persistência suportaram as agruras da existência que
lhes coube.
No Portugal da ditadura e do conflito colonial aflige a
ausência de revolta, a aceitação da pobreza, o apoio à guerra, a indiferença
pelos demais, a dificuldade em juntar esforços com outros iguais por uma ordem melhor.
Numa sociedade selvagem a interiorização acrítica do princípio de “cada um por
si” pelos mais destituídos e pelos que menos têm a ganhar com ele.
Neste livro não há esperança de um tempo melhor, nem ninguém
advoga qualquer mudança. De certa forma, talvez até involuntária, é um livro de
cariz católico em que a estoica perseverança na destituição material e
espiritual, desde que acompanhada de virtude moral, é louvada e aplaudida.
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