Norte e Sul por Elizabeth Gaskell
A Inglaterra da primeira metade do século XIX
dividida entre um Norte industrial e um Sul rural. Deslocada da zona meridional
a família de um antigo pastor da Igreja Anglicana confronta-se com o novel
sistema social do capitalismo, o espírito empreendedor, a azáfama dos negócios,
o fumo das fábricas, mas também com a fome, a miséria, as doenças laborais, o
desespero, as greves e o confronto social.
Perdida neste novo mundo, Margaret, a filha
do ex-clérigo, reage como se estivesse em presença das antigas classes sociais,
que prescreviam às classes superiores o desprezo pelo trabalho, compaixão pelos
destituídos, boas maneiras, interesse pela literatura clássica e chá à hora
certa.
Assim o capitalista, dono de fábricas e de
fortuna é visto como inferior na medida em que trabalha e produz não se
limitando a viver ocioso das suas rendas ou a gastar o seu tempo a estudar ou a
praticar as artes liberais. Este tema vai ganhar corpo num interessante debate
entre Margaret e Thornton sobre a diferença entre cavalheiro e homem.
Eivada de uma visão extremamente conservadora
e religiosa a autora vê as classes trabalhadores como inferiores, o seu amor
pelos filhos como uma “espécie animalesca
de afeição”, incapazes de ordenar a sua própria casa sempre vista como “desmazelada” com maneiras rudes “ sentada numa cadeira de baloiço … descuidada”.
Assim não espanta que condene os sindicatos
como “tiranos” ao mesmo tempo que
prescreve o bom comportamento e o sofrimento em silêncio e na aceitação passiva
das más condições de vida.
Critica, contudo, igualmente os capitalistas
por considerarem os trabalhadores apenas como “mãos” e não como seres humanos, nem se preocuparem com a sua sorte.
Defende pelo contrário um paternalismo cristão à maneira sulista que trate os
pobres com dignidade e promova a caridade.
O livro tem características autobiográficas
uma que que Elizabeth Gaskell (1810-1865) era ela própria filha de um ministro
do culto unitarista, nasceu nos arredores de Londres mas viveu parte da sua
vida em Manchester no seu tempo a cidade industrial por excelência.
Um estilo que lembra Jane Austen na atenção
ao detalhe, nas descrições apuradas, no deslindar psicológico finamente
rendilhado das personagens, na sensibilidade feminina, mas que dela se
distância ao abordar temas abertamente sociais, religiosos e filosóficos do seu
tempo.
Seguindo um percurso de argumento, contra-argumento
e a síntese o livro argumenta com inteligência e analisa com argucia os vários
tópicos. Em pano de fundo uma história de amor e de coragem.
Apesar de datado e marcadamente ideológico do
ponto de vista conservador e religioso é, contudo, um livro em que a elevada qualidade
da escrita e a temática desenvolvida tornam interessante.
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