Os condenados da Terra de Franz Fanon
Um livro forte, telúrico, de excecional profundidade
teórica, de grande verdade pessoal que desmonta e denuncia o colonialismo e o neocolonialismo
europeu e norte-americano.
Dividido em cinco partes a primeira aborda a
questão da violência a que o colonizado tem de recorrer para confrontar e
vencer a violência inicial do colonizador.
Neste aspeto “Foi o colono que fez e continua a fazer o colonizado”. Para se
revoltar o colonizado deve atender à simples realidade à sua volta e libertar-se
de amarras religiosas e ideológicas “ O
que o colonizado viu na sua terra é que podiam impunemente prende-lo,
espancá-lo e matá-lo à fome; e nenhum professor de moral, nenhum padre vieram
jamais receber pancada em vez dele, nem partilhar com ele o pão”.
Fanon identifica o campesinato como a força
principal da luta de libertação e alerta para os perigos do neocolonialismo
apoiado por uma burguesia citadina e assimilada.
Na segunda parte fala-nos das Grandezas e
Fraquezas da Espontaneidade, uma das mais polémicas em que retoma a análise de
classes mas afirmando que “nos
territórios coloniais, o proletariado é o núcleo do povo colonizado mais
estimado pelo regime colonial” ao contrário do campesinato “O camponês que permaneceu na sua terra
defende tenazmente as suas tradições e representa na sociedade colonizada, o
elemento disciplinado cuja estrutura social se mantém comunitária”. Por seu
lado a burguesia citadina, organizada em partidos nacionalistas age em favor do
neocolonialismo “Paradoxalmente o governo
nacional, no seu comportamento em relação às massas rurais, recorda em certos
aspectos o poder colonial”.
A terceira parte, de grande densidade de
análise, foca-se nos Desaires da Consciência Nacional e da dificuldade em
ultrapassar a divisão tribal. Esta dificuldade advém da “incapacidade da burguesia nacional dos países subdesenvolvidos
racionalizar a praxis popular, isto é, de extrair daí a razão”. Esta
incapacidade resulta da sua posição no processo de produção “A burguesia nacional dos países
subdesenvolvidos não está orientada para a produção, para a invenção, para a
construção e para o trabalho, está inteiramente canalizada para atividades de
tipo intermédio. Estar no circuito, conhecer os truques, parece ser a sua
vocação profunda”. Apenas serve de “intermediário”
e de “correia de transmissão” do neocolonialismo.
A quarta parte, Sobre a Cultura Nacional,
abre com a célebre frase de Fanon “Cada geração deve, numa relativa opacidade,
descobrir a sua missão, cumpri-la ou traí-la” e desmonta os mecanismos que as
potenciais coloniais usam para apagar a cultura histórica das populações
colonizadas, “orienta-se para o passado
do povo oprimido, distorce-o, desfigura-o e aniquila-o”, e impor a sua
cultura estrangeira.
A última parte é sobre Guerra Colonial e
Perturbações Mentais. Fanon era médico psiquiatra e teve ocasião de trabalhar e
combater na Argélia durante a guerra de libertação. Acompanhou vários casos de
perturbações provocadas pela guerra e reflete sobre elas de forma clínica.
Franz Fanon (1925-1961) foi um dos maiores
pensadores e lutadores africanos do século XX. Membro da Frente de Libertação
da Argélia desenvolveu um intenso trabalho para levar a revolução anticolonial a
várias partes da África francófona. A leitura da sua obra é indispensável para
perceber o colonialismo e o neocolonialismo e para entender as formas de lutar
contra o racismo e a opressão. Um livro que mudou a vida de muitos.
Sem comentários:
Enviar um comentário