Hoje, como ontem: o Estado Novo por
Marcelo Caetano
Em 1946 terminada a II Guerra Mundial que
derrotara o fascismo italiano e o nazismo alemão uma novo alento percorreu a
oposição ao Estado Novo que contou ingenuamente com algum apoio externo para
derrubar Salazar e democratizar Portugal.
Ancorado nas classes dominantes agrárias e na
incipiente burguesia industrial, capitalizando o apoio concedido a americanos e
ingleses na fase final da guerra, recorrendo à repressão policial, mantendo a
censura, viciando as eleições legislativas de 1946 em que só a União Nacional
pôde concorrer e a oposição organizada no MUD (Movimento de Unidade
Democrática) impedida de o fazer, Salazar manteve-se solidamente a sua posição
de ditador.
Marcelo Caetano, Comissário Nacional da
Mocidade Portuguesa (1940-1944) e Ministro das Colónias e figura destacada da
União Nacional profere este discurso no Porto em 1946.
Começa por recordar os erros da I República,
segue com um panegirico a Salazar, prossegue com um elogio de 20 anos de
ditadura e acaba elencando as prioridades para o futuro.
Marcelo Caetano pressente que a questão
social, com tantos a viver na miséria, ganha uma nova centralidade no evoluir
da situação política – “Ouço dizer que
com um nível de vida baixíssimo e vejo fazer dessa afirmação um estandarte
revolucionário”. Note-se a distância ao povo que esta frase denota
denunciada pelo uso da palavra “ouço”. Claro que logo contrapõe que “ Não se podem exigir milagres…”. Apesar
disso propõe uma “campanha de assistência
social” baseada “sobretudo a
solidariedade” mais do que no “socorro
material”, concentrando-se no “amparo,
guia e ensino”.
Um discurso programático que muito revela da
política do pós-guerra da ditadura de Salazar.
Outros problemas que elenca são a democracia,
a ideologia e a educação.
Quanto à democracia a sua solução é simples “Ao menos em Portugal, nada nos diz que se
possa dispensar um governo forte e com permanência…”, i.e., manter a
ditadura.
Na questão ideológica afasta-se do seu
anterior radicalismo pró-fascista e quer fazer-se passar por democrata-cristão “Esta afirmação dos princípios cristãos na
política” mas não deixa de criticar “certos
excessos esquerdistas de alguns cristãos-sociais”. Com isto pretende legitimar
o regime no seio de uma Europa ocidental dirigida por democratas-cristãos e
social-democratas.
Para a educação, área em que Portugal ocupa,
como hoje, um dos últimos lugares na Europa, propõe mantê-la elitista para que
Portugal “possa contar com um escol moral
e tecnicamente bem formado” e “para
que a colonização dos territórios ultramarinos seja feita por elementos aptos a
manter o prestígio europeu e português perante as populações indígenas em
evolução”. Este parágrafo é revelador, as incultas populações portuguesas
são equiparadas em instrução às populações indígenas das colónias. Uma
realidade difícil de esconder.
Um livro revelador da política do Estado Novo
para manter o fascismo em Portugal num momento em que a Europa ocidental adotava
um novo figurino político. Desfaz o mito muito propagandeado de que
Caetano seria um “liberal” do regime, quando pelo contrário todo o seu percurso
foi a de um fiel seguidor e apoiante da ditadura salazarista, mesmo em períodos
como em 1946 em que o regime esteve prestes a cair.
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