terça-feira, 1 de novembro de 2011

A questão Finkler

A Questão Finkler por Howard Jacobson

Uma auto-consciência aguda, crítica e irónica da situação judia é o ingrediente que humaniza este livro e torna a sua leitura simultaneamente divertida e intelectualmente estimulante.

Mas por baixo desta camada superficial de um verniz brilhante de auto-critica impiedosa revela-se uma defesa intransigente de Israel, do sionismo, da diabolização dos palestinos e o retrato dos gentios como seres destituídos de senso, desejosos de se tornarem judeus.

O livro é um toque a rebate para a unidade da disporá judaica. Subtilmente o autor defende que apesar da secularização, apesar das críticas superficiais e até ridículas a Israel de alguns judeus, apesar de alguns aspectos da religião, como a circuncisão, poderem ser descritos de uma forma cómica, no fundo os judeus serão sempre judeus e devem permanecer unidos face ao anti-semitismo crescente em todo o mundo, e que é importante manter e apoiar um Estado que possa em caso de necessidade servir de abrigo aos judeus dispersos pelo mundo.

Muitos aspectos do judaísmo são colocados à discussão, a visão crítica é apresentada, mas sempre sob uma tal luz, que a torna superficial e sem verdadeiro sentido, enquanto a visão tradicionalista que é num primeiro momento atacada acaba por, astutamente, surgir como profunda e mais adequada. A crítica mesmo que mordaz, mesmo que apresentada com simpatia, salientando a sua elegância intelectual e o seu evidente forte lado apelativo, mesmo que lógica esbarra desajeitadamente na solidez da tradição.

A luta dos palestinianos e os ataques anti-semitas são misturados e confundidos para que surjam como sinónimos na cabeça dos leitores. Mas o assassinato de palestinianos só aparece executado por um louco desesperado preste a ser despejado com a sua mulher e os seus numerosos filhos do seu colonato. Pela discrição que é feita, percebemos o seu acto tresloucado e por um momento como que nos esquecemos das vitimas inocentes e simpatizamos com ele. A mensagem está lá os palestinos são terroristas mas os excessos dos israelitas são fruto dos nervos em franja pela pressão que a resistência palestina.

O personagem Treslove, o protótipo do gentio, surge como um indivíduo irresponsável, destituído de engenho e arte, um morto vivo errante pela face da terra sem objectivo nem destino. Na sua melhor fase, quando se interroga sob o sentido da sua vida e está finalmente pronto, aos 49 anos, para assumir afirmativamente o seu destino o que escolhe é … tornar-se judeu. Uma verdadeira impossibilidade, uma vez que só pode ser judeu quem nasce de mãe judia.

Um livro inteligente, não panfletário mas claramente partidário. Uma mensagem de racismo e ódio sob uma capa de bonomia e auto-reflexão. Um exemplo de como a propaganda pode andar de mão dada com o bom gosto, com a erudição e com o sentido de humor mais requintado, em suma com a literatura.

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