sábado, 19 de dezembro de 2015

Monte dos Vendavais



Monte dos Vendavais por Emily Brontë

Um amor louco que se inicia numa infância partilhada, que cresce em plena natureza agreste numa adolescência selvagem, que encontra um obstáculo sério e descamba por um mal-entendido mas que só se esgota e extingue com a morte. Ódios entranhados profundamente num espírito determinado e saciados com crueldade demoníaca numa vingança que não satisfaz nem sossega.

Um duelo de vontades que esgota os contendores e os leva, do mais fraco ao mais forte, à sepultura ainda que no fim sobrevivam os mais inocentes.

Personagens fascinantes, movendo-se num cenário limitado geograficamente, alargado no tempo e psicologicamente concentracionário, sob um céu cinzento, ventoso e ululante, algures em Inglaterra, sofrem e fazem sofrer.

Curiosa a forma como a história nos é contada através de um duplo narrador, ou melhor de um narrador que escreve fielmente, quase diríamos palavra por palavra, o que ouviu da boca da testemunha principal do drama.



Emily Brontë só escreveu um romance mas escreveu uma obra-prima da Literatura mundial. Indispensável.

sábado, 5 de dezembro de 2015

Se isto é um Homem

Se isto é um Homem de Primo Levi

Um livro escrito, logo após a sua libertação do campo de concentração (Lager) de Buna, integrante do complexo de Auschwitz e Birkenau, pelo Exercito Vermelho e o consequente regresso a sua casa em Turim, na Itália, a quente, com as memórias frescas, com o horror bem presente, com os olhos ainda molhados pelos amigos, compatriotas e judeus de outras nacionalidades barbaramente mortos pelos alemães nos campos de extermínio.

Preso na Itália, Primo Levy conta-nos como foi deportado para o campo da morte onde logo à chegada a maioria foi assassinada pelos alemães (“sabemos que nos campos, respectivamente de Buna-Monowitz e Birkenau, só entraram, do nosso comboio, noventa e seis homens e vinte e nove mulheres e que todos os outros, num total de quinhentos, nem um se encontrava vivo dois dias depois”).

A forma iníqua como os alemães conseguiram, através da descaracterização pessoal, da marcação com números eliminando nomes, da fome, do frio (“Da mesma forma com que se vê acabar uma esperança, assim hoje de manhã chegou o Inverno” “Significa que, ao longo destes meses, entre Outubro e Abril, em cada dez de nós, sete irão morrer”), do excesso de trabalho, dos castigos corporais constantes, das selecções frequentes para as câmaras de gás, desumanizar os presos nos campos de concentração e morte e levá-los a uma existência centrada na simples luta pela sobrevivência muitas vezes sem qualquer esperança (“Sabem como se diz «nunca» na gíria do campo? «Morgen Fruh», amanhã de manhã”).

Mas mesmo nestas condições extremas pôde florescer a amizade, a resistência e a entreajuda entre as pessoas.

Um dos melhores livros do século XX.


domingo, 29 de novembro de 2015

Psicologia do Dinheiro



Psicologia do Dinheiro por Georg Simmel

Georg Simmel foi um imaginativo sociólogo alemão, de origem judaica, do final do século XIX princípios do século XX e conjuntamente com Karl Marx, Max Webber e Émile Durkheim como um dos pais da Sociologia.

Reunidos neste livro estão quatro palestras proferidas por Simmel sobre o dinheiro: i) Psicologia do Dinheiro, ii) O dinheiro na cultura moderna, iii) Sobre a Avareza, o esbanjamento e a Pobreza e por ultimo As grandes cidades e a vida do espírito.

O primeiro texto analisa o fenómeno psicológico de transformação de simples meios em fins em si mesmos. Partindo da ideia de que “Diagnostico os meios para um fim quando identifico as causas que o determinam” Simmel concluiu que o dinheiro é um simples meio de que os seres humanos se servem para atingir os seus fins, i.e. obterem os produtos e serviços de que necessitam. Contudo certas pessoas, esquecendo o fim último do dinheiro, fazem da sua acumulação um fim em si mesmo, renunciando, mesmo, a trocá-lo por bens. Esta é a curiosa base de todo um raciocínio muito subtil e elucidativo.

O dinheiro, segundo Simmel tende a ocupar o lugar de Deus nas sociedades capitalistas de tal forma é a sua força de nivelamento de todas as coisas – tudo, ou quase, se pode converter em dinheiro, desde o trabalho a qualquer objecto – e tornando-se o ponto de confluência de tudo. “O pensamento de Deus tem a sua essência mais profunda no facto de que toda a multiplicidade do mundo chega nele à unidade, de que ele é, segundo a bela expressão de Nicolau de Cusa, a coincidentia oppositorum… a sua semelhança com a representação do dinheiro é clara”.

Outros argumentarão, com razão, que Simmel não percebeu que o dinheiro há muito que não é um mero meio de troca, mas se transformou em capital, cuja acumulação é a base de funcionamento do sistema económico actual.

Apesar desta falha estrutural o pensamento de Simmel não deixa de nos surpreender com a sua minúcia, poder de observação, de lógica, de síntese e de perspicácia. Imprescindível.

domingo, 22 de novembro de 2015

As Mulheres da Fonte Nova



As Mulheres da Fonte Nova por Alice Brito

Uma cidade de província, Setúbal, pobre, explorada por estrangeiros, vivendo dependente de uma única indústria, sentindo o peso da miséria que se perpetua sob a vigilância apertada da polícia política, imersa numa moral hipócrita, mesquinha e beata.

Um bairro especial, o Troino, com o seu Largo da Fonte Nova, com o seu ambiente típico de casa de homens pescadores e mulheres operárias conserveiras, com a apertada solidariedade entre a sua gente, com a fome a espreitar, com a sua topografia apertada, as suas ruas estreitas num desordenamento espacial.

A saga de várias mulheres ali “nascidas e criadas” que atravessa todo o terceiro quartel do século XX.

Um livro interessante com um certo sabor, que saudamos porque necessário nos dias que correm, a um regresso ao realismo mas que peca pelo final inverosímil, pouco inspirado e que é a milionésima repetição de um tema já muito glossado, e por uma visão política sectária.