sábado, 29 de agosto de 2009

Utilitarianism


“The greatest good for the greatest number of people"

Qual é o critério que permite distinguir as acções boas e correctas das más e incorrectas? A resposta de John Stuart Mill, um dos mais influentes pensadores liberais, deve encontrar-se nas consequências dessas acções. Se a acção contribui para o aumento da felicidade ela é boa, se contribui para a diminuição da felicidade ela é má. Felicidade de quem? Não de uma ou outra pessoa mas a felicidade total da Humanidade, em que a felicidade individual de cada um conta de maneira igual. Este princípio básico, que dispensa, mas não exclui, a religião, enunciado por Jeremy Bentham é conhecido por utilitarismo, designação que pode ser enganadora, ao sugerir algo menos nobre e mais prático.

Em poucas páginas John Stuart Mill expõe, de forma densa mas muito clara, os princípios básicos do utilitarismo e rebate as principais objecções que a este se contrapunham.

Hoje o utilitarismo é uma das filosofias dominantes no ocidente, nomeadamente no mundo anglo-saxonico. Lamentavelmente as obras de Jeremy Bentham e de John Stuart Mill, com uma ou outra excepção, não se encontram ainda traduzidas para português.
E se em geral concordo com o princípio base do utilitarismo, discordo de muitas das conclusões práticas propostas por Bentham ou por Mill, na medida em que nestas o Homem surge reduzido apenas aos membros de um grupo específico.

O livro inclui um segundo texto de John Stuart Mill, um discurso sobre a pena de morte em que o autor defende a sua aplicação no Reino Unido.

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Combateremos a Sombra





Parole, Parole, Parole, Parole, Parole
encore des Paroles que tu sèmes au vent

Encore des mots toujours des mots
les mêmes mots
Rien que des mots



Parra, muita parra e pouca uva. Palavroso assim é este livro de Lídia Jorge. As mais simples e lineares ideias são expressas com dezenas e dezenas de palavra, que sem contribuírem para uma melhor explanação do conceitos, nem para uma melhor nitidez dos episódios, nem mesmo para um recorte mais preciso das personagens, concorrem para tornar o texto chato, aborrecido, sem ritmo nem cadência. Daria um excelente filme da escola portuguesa a la Manuel Oliveira.

A história é de uma linearidade acabada, tudo alinhado do princípio ao fim, sem uma surpresa, sem um desvio. O herói do romance é um psicólogo, Osvaldo Campos, perdido num mundo que não conhece mas em que pretende ingenuamente actuar. O seu perfil é inverosímil, um ser tão incauto, que sabendo que vinte e uma personalidades de peso da sociedade estão implicadas numa rede criminosa desata a enviar cartas a tudo o que é instituição declarando-se pronto a testemunhar, tão sincero que tendo posto a namorada a salvo no estrangeiro depois conta a toda a gente onde ela está. A sua estupidez é deveras surpreendente.

Pior Osvaldo Campos é um psicólogo incompetente, seguidor tardio de Freud - hoje visto mais como um avô desta ciência do que como alguém cujas ideias ainda sejam seguidas.

Enfadonho. Não gostei. Muito fraco.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

A Conquista da Felicidade



Devo confessar uma admiração pela vida e obra de Bertrand Russell, um Homem da renascença em pleno século XX. Russell distinguiu-se como filosofo, matemático, historiador. Mas acima de tudo como grande humanista, moralista e pensador progressista.

Livros como Porque não sou Cristão (Why I Am Not a Christian, 1927) e O que eu acredito (What I Believe, publicado em 1925) foram decisivos na minha formação como ser humano.

Neste livro – A Conquista da Felicidade - Russell começa por, de forma lógica, límpida e sustentada apresentar as causas da infelicidade e as maneiras de as combater para, de seguida, numa segunda parte, enumerar e caracterizar os ingredientes que o Homem pode juntar para tornar a sua existência feliz e para contribuir para a felicidade dos que o rodeiam.

A infelicidade nasce do espírito de competição, do aborrecimento, da fadiga (aqui incluída o que chama de fadiga emocional e que comummente designamos por stress), do sentimento de culpa, da mania da perseguição, do medo da opinião pública (a opinião dos outros). A estas adiciona outras duas: a inveja e a infelicidade byroniana.

A infelicidade byroniana é de carácter intelectual e consiste na crença de que nada vale a pena (Os rios correm para o mar e o mar não enche / Não há nada de novo debaixo do Sol). A esta ideia contrapõe o amor que na sua definição ´”é intrépido e vigilante, permite ao mesmo tempo o conhecimento do bem e não implica o esquecimento do mal, nem pretende ser sagrado ou santificado”. E acrescenta “...o amor é uma fonte de prazer, mas também a sua ausência é uma fonte de sofrimento. Em segundo lugar, o amor deve ser apreciado porque dá realce aos melhores prazeres da vida, tais como ouvir música, assistir ao nascer do sol nas montanhas, o ver a luz do luar espelhada nas águas”.

Sobre a inveja, não obstante considerá-la como uma causa de infelicidade, escreve: “A inveja é a base da democracia.”. Será?

A inveja surge devido às desigualdades entre as pessoas. Mas como combater a inveja? Russell escreve: “Logo que se examinam as desigualdades, descobre-se a sua injustiça, a não ser aquelas que assentam nalguma superioridade de mérito. E desde que as consideremos injustas não há outro remédio para a inveja que delas resulta senão a eliminação da injustiça.”

O gosto de viver, a afeição pelas pessoas e pelas coisas, a família, o trabalho, os interesses impessoais (a que chamaríamos hobbies), o equilíbrio entre esforço e resignação são os ingredientes que fazem o homem feliz.

Um excelente livro.

domingo, 23 de agosto de 2009

O Caderno


Um diário com, passe o paradoxo, meditações espontâneas sobre o quotidiano, sobre os dias que passam (“...dos dias sabemos nós que são iguais mas não se repetem.”) e os acontecimentos, públicos e privados, que os preenchem.

Já conhecidas são as reflexões sobre a sociedade actual - “Os mais de sete mil milhões de habitantes deste planeta, todos vivem no que seria mais exacto chamarmos a civilização mundial do petróleo” – e sobre o sistema político – “... que se é verdade serem os povos governados, verdade é também que não o são por si mesmos nem para si mesmos. Não é em democracia que vivemos, mas sim numa plutocracia que deixou de ser local e próxima para tornar-se universal e inacessível...”.

Certeiro é, em minha opinião, o que diz sobre a esperança que políticos e sacerdotes não cessam de apregoar – “Dantes ao pobre de pedir a quem se tinha acabado de negar a esmola acrescentava-se hipocritamente que <>. Penso que na prática aconselhar alguém a que tenha esperança não é muito diferente de aconselhá-lo a ter paciência”.

Oportuna é a sua defesa dos palestinianos, vítimas do terrorismo israelita ("...matar em nome de Deus é fazer de Deus um assassino...”) e a denuncia dos crimes da ditadura argentina, nomeadamente dos cometidos pelo padre católico Christian von Vernich.

Excessiva e errada é a sua opinião de que as FARC colombianas, organização guerrilheira que combate à várias décadas, muito antes de Bush ter iniciado a guerra ao terrorismo, são uma organização terrorista.

Este livro é, também, uma porta aberta, uma pista traçada no papel para a descoberta de um grande conjunto de intelectuais, escritores, fotógrafos, teólogos, filósofos e mesmos economistas de grande qualidade mas cuja obra é praticamente desconhecida em Portugal. Aqui ficam alguns nomes: Basílio Baltasar, Juan José Tamayo, Angel González, Gervásio Sánchez, Lilly Ledbetter, Hans Kung, Andrea Camilleri, Paolo Flores dÁrcais, Carlos Fuentes, Frederico Mayor Saragoça, José Luís Sanpedro, Rita Levi-Montalcini, etc, etc.

sábado, 22 de agosto de 2009

Três Lições sobre o Estado-Providência

O Estado Providência está em crise proclamam os conservadores porque vivemos anos demais asseguram, porque é excessivamente generoso concordam os socialistas que, no poder, aproveitam para eliminar prestações sociais na saúde, diminuir as pensões e aumentar o tempo de trabalho. Estes discursos gastos e políticas erradas enchem os jornais, povoam os debates televisivos, convenceram muitos sindicalistas e eleitores.

O Professor dinamarquês Gøsta Esping-Andersen apresenta-nos em 3 esplêndidas lições uma análise serena e fundamentada, longe dos slogans panfletários neoliberais, os desafios colocados ao Estado Providência e pistas para os enfrentar com êxito.

Para Gøsta Esping-Andersen o grande desafio ao Estado Providência é a revolução feminina cujos efeitos na demografia, com a forte redução da natalidade, tem levado ao envelhecimento das sociedades actuais (“A rapidez com que a sociedade actual envelhece é, em larga medida, um dos efeitos desta revolução feminina” página 40).

O novo papel da mulher na sociedade requer alterações profundas nas políticas sociais do Estado Providência. (“É um paradoxo dos nossos tempos que as políticas familistas impeçam a fundação da família” página 43)

O que propõe Gøsta Esping-Andersen? Um período de licença pós parto longa (de cerca de 1 ano), a disponibilização de uma rede de creches pública e gratuita para crianças de 1 ano até aos 3 anos, a antecipação da idade escolar para os 3 / 4 anos, generalizando o ensino pré-primário.

O objectivo? Permitir às mulheres terem filhos (aumentar a taxa de natalidade – “Está empiricamente provado que a existência de cuidados de infância faz aumentar a fecundidade” página 47) e voltar ao trabalho (aumentar a população activa – nos países onde a licença de maternidade é mais longo e onde existem serviços públicos de guarda de crianças a taxa de regresso ao trabalho é mais elevada).

E como pagar estas novas despesas sociais (o autor prefere chamar-lhes investimentos)? Gøsta Esping-Andersen calculou que, para uma mulher que receba 67% do salário médio e que tenha dois filhos, os custos para as duas crianças associados com 2 anos de creche e 3 de pré-primária poderiam ascender a 72 mil euros e que as receitas fiscais decorrentes de manter a mulher a trabalhar durante mais 30 anos serão de 110 mil Euros. O Estado ganha assim mais 30 mil Euros com esta política social. A sociedade em geral ganha muito mais. O social paga-se a si próprio. Já o intuíamos, Gøsta Esping-Andersen, prova-o cientificamente.

Soluções interessantes são também apresentadas sobre a educação e os cuidados a idosos.

Particularmente interessante é a constatação que a pobreza infantil, tão extensa no nosso país, tem custos económicos enormes. Um estudo levado a cabo nos EUA avaliou esse custo “em 4% do PIB, dos quais 1,3% é imputável à redução de produtividade, 1,3% à criminalidade e 1,2% aos efeitos sobre a saúde.”. De facto os gastos com o sistema judicial, as prisões são elevados e os gastos com a saúde mais precária de quem é pobre são elevados e pagos pelos impostos de todos. Uma política eficaz como a dos países nórdicos de redução significativa da pobreza infantil custa 3% a 4% do PIB. O custo é o mesmo a questão está em como gastar mais eficazmente: reduzir a pobreza infantil ou gastar em cadeias e custos de saúde evitáveis?

Livro do maior interesse que recomendo a todos os que queiram perceber o futuro do Estado Providência e as opções que se abrem em termos do seu futuro.


sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Salgalhadas na Lusolândia



O segredo que a misteriosa Professora Maria Adelaida responsável da Informática da cimeira internacional reunida em Lisboa descobre pode alterar o curso da História e salvar milhões de seres humanos de uma morte friamente planeada. Com os terriveis serviços secretos portugueses no seu encalço será ela capaz de dar a conhecer ao mundo a horrível verdade?


Salgalhadas na Lusolândia é uma história divertida que, com humor e leveza, caricatura a sociedade portuguesa actual e a sua limitada classe política.

Uma vergonha para o submundo editorial cá da terra que Salgalhadas na Lusolândia apareça em edição do autor, quando tem todos os ingredientes para, com a adequada chamada de atenção do público, ser um best-seller.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

A Voz Humana


Uma peça de teatro para uma só actriz. Toda a acção na voz, nas infindas entoações sonoras que transmitem, para além das palavras pronunciadas, os sentimentos, as emoções e as sensações. A voz que mente e que diz a verdade, a voz que oculta ou que descobre, a voz que media entre o Eu e o Outro.

Uma mulher fala com o antigo amante. Triste mas cordialmente fazem as últimas despedidas, até que uma queda acidental de linha, faz com que a mulher descubra que o homem lhe está a mentir. A partir deste momento o tom muda, chora o amor perdido, confessa uma tentativa de suicídio e despede-se com uma longa declaração de sofrimento e amor.

Um diálogo de que se ouve apenas um interlocutor não se transforma num monólogo, mas pode ser percebida como tal. E este engano, de que a personagem fala consigo mesma quando na verdade fala com o antigo amante, leva a que lhe atribuamos imediatamente a ela toda a razão. A descoberta da mentira dele impele-a a finalmente romper com a falsa amistosidade e a contar a triste Verdade. Mas será assim?

Poderá ser que ao perceber a mentira dele, também ela tenha começado a mentir? O ciúme pode ter desencadeado uma vontade de o levar a ter pena dela, a sentir remorsos por a ter abandonado.

Esta ambiguidade não encontra resposta no texto, só pode ser desfeita pela actriz, que com a sua voz, uma voz humana, pelo tom que colocar nas palavras, pela ênfase que der ao texto, nos fará inclinar por uma ou outra solução.

Uma obra-prima.