quinta-feira, 6 de agosto de 2009

A Voz Humana


Uma peça de teatro para uma só actriz. Toda a acção na voz, nas infindas entoações sonoras que transmitem, para além das palavras pronunciadas, os sentimentos, as emoções e as sensações. A voz que mente e que diz a verdade, a voz que oculta ou que descobre, a voz que media entre o Eu e o Outro.

Uma mulher fala com o antigo amante. Triste mas cordialmente fazem as últimas despedidas, até que uma queda acidental de linha, faz com que a mulher descubra que o homem lhe está a mentir. A partir deste momento o tom muda, chora o amor perdido, confessa uma tentativa de suicídio e despede-se com uma longa declaração de sofrimento e amor.

Um diálogo de que se ouve apenas um interlocutor não se transforma num monólogo, mas pode ser percebida como tal. E este engano, de que a personagem fala consigo mesma quando na verdade fala com o antigo amante, leva a que lhe atribuamos imediatamente a ela toda a razão. A descoberta da mentira dele impele-a a finalmente romper com a falsa amistosidade e a contar a triste Verdade. Mas será assim?

Poderá ser que ao perceber a mentira dele, também ela tenha começado a mentir? O ciúme pode ter desencadeado uma vontade de o levar a ter pena dela, a sentir remorsos por a ter abandonado.

Esta ambiguidade não encontra resposta no texto, só pode ser desfeita pela actriz, que com a sua voz, uma voz humana, pelo tom que colocar nas palavras, pela ênfase que der ao texto, nos fará inclinar por uma ou outra solução.

Uma obra-prima.

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