terça-feira, 19 de novembro de 2024

Noites Brancas

Noites Brancas de Fiódor Dostoiévski

 

A descrição minuciosa, profunda, exemplificada de um tipo humano, de uma personalidade, um carácter. O sonhador, o introvertido, analisado, aberto, dissecado, exposto, de forma crua mas sensível, de maneira simultaneamente detalhada e panorâmica.

 

Vidas que brilham por um breve momento logo caindo na penumbra sem coragem, nem alento de voltar à luz do dia, de arriscar, de se expor, de manifestar os seus sonhos, vivendo de fantasias interiores que os anos desfazem e deixam o amargor dos anseios não realizados e inúteis.

 

Quatro noites, uma breve relação fugaz, exaltada, platónica mas intensa de sentimentos, de lágrimas e de esperanças, cujo enlevo e memória chegam para preencher “toda a vida de um homem”. A constância e arrebatamento do personagem, a inconstância e fluidez da jovem formam um contraste intrigante.

 

Fiódor Dostoiévski (1821-1881), escritor russo. Por conspirar contra a tirania do Czar foi preso, condenado à morte, pena depois comutada em prisão e trabalhos forçados na Sibéria. Converteu-se e acabou mesmo por ser tutor dos filhos do Czar Alexandre II. As suas obras são clássicos da Literatura russa do século XIX – obras-primas como os Irmãos Karamazov, O Idiota, Crime e Castigo, Gente Pobre, são marcos maiores do seu percurso literário.


 

domingo, 17 de novembro de 2024

As Causas do Atraso Português


 

As Causas do Atraso Português por Nuno Palma

 

Surpreendentemente desalinhado com as teses dominantes, penetrante, bem documentado, assente numa visão que rejeita “a história escrita pelos vencedores” mas também a escrita pelos estrangeiros. Nuno Palma atribuiu a causa do atraso económico português ao afluxo de ouro do Brasil, que potenciou a regressão das instituições políticas no país, e à política de expulsão dos Jesuítas pelo Marquês de Pombal sem que tenha sido implementada solução alternativa ao papel que desempenhavam no ensino, o que nos atrasou no campo da educação (atraso que ainda não superámos).

 

Também tem razão quando afasta o falso argumento de que “a culpa é do regime anterior” sempre evocada quer pelos primeiros republicanos, a culpa é da Monarquia, pelos fascistas, a culpa é dos republicanos, quer atualmente. Na verdade o falhanço de cada regime funda-se nas suas próprias políticas e/ou na continuidade de políticas erradas. Igualmente lhe damos razão quando identifica a causa da longa estagnação porque Portugal passa nas últimas décadas com os fundos europeus, que permitem às empresas sobreviver sem se modernizarem, assentando o seu modelo de negócio em subsídios e mão-de-obra barata.

 

Estes aspetos positivos da sua obra perdem-se, contudo, quando não aplica os seus próprios preceitos à sua análise (a culpa da situação atual é do 25 de Abril e do socialismo – algo morto e enterrado há 50 anos), quando avança com uma agenda neoliberal para a atualidade, quando incensa o Estado Novo, quando eleva Lucas Pires, um dirigente secundário de um partido secundário, a visionário e herói nacional.

 

Não se deve deitar o bebé fora com a água do banho. Este livro constrói uma explicação credível para o atraso português desde o século XVIII até à atualidade. Peca, contudo, pela contaminação ideológico-partidária do autor e por algumas contradições metodológicas graves.

 

Nuno Palma, economista, professor catedrático na Universidade de Manchester no Reino Unido.

quarta-feira, 13 de novembro de 2024

Amarelo Tango


 

Amarelo Tango por Nicolau Santos

 

O colonialismo pelos olhos de um colono. O racismo visto do ângulo de um colono branco. O processo de independência de Angola observado pelo prisma do colono regressado à metrópole. A nostalgia de uma forma de exploração do ponto de vista do explorador colonial. A revolução vivida por um revolucionário que confunde Chu En-Lai com Ho Chi Minh e que pensa que o primeiro era Vietnamita.

 

Um livro que é um grande equívoco. O que pretende ser um relato distante de um período histórico torna-se uma farsa. Primeiro temos a mistificação do colonialismo. Os colonos viviam bem porque trabalhavam muito. Não porque praticavam o trabalho forçado, a exploração da mão-de-obra nativa. A verdade porém, sentida por quase todos os retornados, é que a sua qualidade e nível de vida, caiu dramaticamente, apesar de continuarem trabalhadores esforçados. Depois temos a mistificação da violência. A colonial é apresentada como autodefesa, a reação dos povos africanos é apresentada como bárbara.

 

Eivado de nostalgia colonialista, de racismo, de preconceito político, o livro, sem qualidade literária, peca igualmente por erros históricos crassos e frequentes.

 

Nicolau Santos (n. 1954) é um gestor português. Atualmente Presidente do Conselho de Administração da RTP.