domingo, 28 de setembro de 2025

Siríaco e Mister Charles

                                                Siríaco e Mister Charles por Joaquim Arena

 

Um romance com fundo histórico que vagueia entre os três continentes ligados pela infame economia transatlântica construída sobre o tráfego de pessoas escravizadas. No centro deste triângulo um homem singular Siríaco e uma ilha especial, Santiago no arquipélago de Cabo Verde.

Duas personagens muito diversas que se encontram brevemente mas que causam impressão mútua duradoira: Siríaco e Charles Darwin. A passagem do Beagle, navio em que viajou o pai da teoria da evolução, por Cabo Verde está bem documentada e relatada com pormenor nos Diários publicados por Darwin. Siríaco por outro lado surge retratado em pintura, hoje exibida no Musée du Nouveau Monde sediado na cidade francesa de La Rochelle, da corte da rainha portuguesa Dona Maria I.

Um encontro improvável mas significativo do encontro de mundos, de culturas, de identidades. O pensamento científico, a crença em acontecimentos extraordinários, a assimilação temporária. O livro peca pela placidez em tempo de grande violência e ao descrever de forma benigna a escravização de pessoas não vendo a crueldade que lhe está inerente. Também as fomes em Cabo Verde que matavam milhares de pessoas ciclicamente surgem como inevitáveis e como destino e não como crime colonial.

Joaquim Arena (n. 1964) é um romancista cabo-verdiano.

domingo, 21 de setembro de 2025

The World After Gaza

The World After Gaza por Pankaj Mishra

 

Como uma narrativa de real perseguição e extermínio no Holocausto se transformou na desculpa para cometer crimes de igual monta contra a população palestina. Os avisos dos intelectuais judeus, dos sobreviventes do Holocausto, foram sistematicamente ignoradas e Israel tornou-se numa máquina que esmaga sem contemplações mulheres e crianças, que destrói hospitais, bombardeia escolas, mata, mata, mata, mata tudo e todos. Com orgulho, com a crueldade e a desumanidade.

 

Um livro inteligente, muito bem documentado, que convoca uma miríade de escritores e pensadores judeus para nos ajudar a compreender como se pode chegar a tal extremo. Perceber como se insere o genocídio em Gaza na triste trilha de genocídios cometidos pelo Ocidente contra os povos colonizados. Como esses genocídios foram sempre fruto de ideologias como o sionismo, assentes em bases nacionalistas-etno-raciais.

 

Como os povos ocidentais se tornaram impotentes, se transformaram em simples expectadores incapazes de ação decisiva perante o intolerável, o horror. A esperança reside na minoria que por toda a parte desce às ruas para exprimir a sua condenação destes atos brutais cometidos à luz do dia com a cumplicidade dos nossos governantes.

 

Indispensável leitura.

 

 

quarta-feira, 10 de setembro de 2025

A luta de tendências no movimento estudantil pré-25 de Abril


 

A luta de tendências no movimento estudantil pré-25 de Abril de José Manuel Jara

 

A luta estudantil antes do 25 de Abril, no final dos anos 1960 e no início dos anos 1970 centrou-se em duas frentes: a luta contra o regime fascista e a luta de fações no interior das escolas e faculdades. Nesta época, fruto da cisão do movimento comunista internacional, entre a URSS e a China, emergiram diversos grupos de cariz maoista que se opunham entre si e aos estudantes comunistas organizados na UEC.

 

Este livro, escrito por um então destacado dirigente da associação de estudantes de Medicina de Lisboa relata os tristes episódios divisionistas quando foi falsamente acusado de ser um provocador pelo grupo da fação “por um ensino popular” liderada por Ferraz de Abreu da Associação da Faculdade de Ciências. A luta pela hegemonia no movimento estudantil foi ganha pelos estudantes da UEC mas as restantes fações continuaram ativas durante todo este período.

 

Um excelente trabalho, muito bem documentado que analisa o caso da expulsão e readmissão de um dirigente estudantil.

 

José Manuel Jara é um médico psiquiatra português.

quinta-feira, 4 de setembro de 2025

A Biblioteca – Uma segunda casa por Manuel Carvalho Coutinho


 

A Biblioteca – Uma segunda casa por Manuel Carvalho Coutinho

 

Uma breve apresentação e apreciação de uma amostra substancial de Bibliotecas Municipais do Continente da Madeira e dos Açores, incluindo uma das mais antigas do país, a de Vila Real. O que deve ser uma Biblioteca? A resposta está explicita no título: uma segunda casa.

 

Como no caso das autoestradas, a abundância de financiamento público europeu levou à construção de um grande número de Bibliotecas, mesmo em regiões onde os leitores são escassos e o interesse pela cultura diminuto. Tendo-se começado pelo telhado, que fazer agora com estes equipamentos, quais estádios abandonados e de manutenção cara? Torna-los polos de cultura que procurem dinamizar o público local? Fechar-se sobre si mesmos? Fechar?

 

Interessante a questão dos horários. São impossíveis para quem trabalhe, reduzindo os frequentadores aos reformados e parcialmente aos estudantes. Há mais de uma década visitei a pequena cidade de Bath localizada no vale do Avon na Inglaterra e entrei na sua Biblioteca universitária. Está aberta 24 horas por dia, oferece centenas de milhares de livros, é aquecida (por cá as Bibliotecas são frias) e tem zona para refeições e convívio. Estava cheia.

 

Fiquei com vontade de visitar várias Bibliotecas.