sábado, 28 de janeiro de 2012

A Selva

A Selva por Ferreira de Castro

O ser humano é a sua circunstância. Transplantem um jovem universitário português, monárquico convicto, catolicamente elitista, para o ambiente inóspito de uma selva cerrada, obriguem-no a trabalhar de sol a sol numa tarefa dura e solitária por pouco mais do que a comida, dêem-lhe como morada, junto de um igarapé, uma simples cabana desprovida de comodidades, exponham-no aos ataques dos parintintins e das feras e terão um seringueiro em estado puro, que pouco ou nada se distingue do trabalhador do Ceará trazido para a Amazónia pelos angariadores de mão-de-obra sem escrúpulos.

No barco, subindo o Rio Madeira, rumo ao coração da brenha, sentia-se estranho no convés dos trabalhadores e aspirava a subir para a primeira classe, depois, já na humilde cabana que seria a sua morada, à medida que aprendia o trabalho, que partilhava a vida e as dificuldades dos colegas, foi-se a sua consciência transformando e moldando, para finalmente a sua solidariedade, que como estudante universitário estaria com o dono da exploração de borracha, se transferir total e completamente para o lado dos seringueiros.

Um livro, injustamente esquecido, muito esclarecedor sobre a natureza humana.

domingo, 22 de janeiro de 2012

Tonio Kröger



Tonio Kröger de Thomas Mann

A condição do escritor, aspirando à Vida pura, prática, saudável, ingénua e espontânea do burguês comum, mas irremediavelmente contaminado pela Arte que, com o seu pensamento estético e reflexo, tudo estraga e conspurca. O artista carrega a maldição de amar um tipo de vida que lhe está vedada, na medida em que a consciência destrói a indispensável candura inerente à vida comum. Ao artista resta-lhe observar o bailado da existência humana de fora, tal espião ou intruso indesejado, profundamente angustiado e infeliz por nele não poder participar.

Esta pequena novela acaba, também, por ser uma chave indispensável para a compreensão de outra obra do autor “Os Buddenbrooks”. Nos dois livros a mesma contradição entre a Vida e a Arte. Mas o que ali é ténue, entrevisto, esbatido, repartido entre vários personagens e gerações é aqui claro e explícito, concentrado num único personagem que tem plena consciência do seu drama e a ele se entrega.

domingo, 15 de janeiro de 2012

7 ideias filosóficas que toda a gente deveria conhecer




7 ideias filosóficas que toda a gente deveria conhecer por Desidério Murcho

7 ideias filosóficas que toda a gente deveria conhecer, apresenta-nos de uma forma simples, didática, apelativa e despretensiosa sete temas filosóficos de importância. Ideia como “Penso, logo existo” e “Só sei que nada sei” são explicadas e contextualizadas.

Nota-se que o autor domina os temas e consegue expô-los numa linguagem acessível ao leitor comum. A única exceção surge já perto do fim quando pretende explicar as operações lógicas que incluem “necessidade” e “possibilidade” em que se perde a limpidez do raciocínio e se entra numa zona de espeça nebulosidade de que não conseguimos sair. Não fosse este último capítulo e o livro seria um excelente manual de introdução às principais teorias filosóficas.

A Tragédia do Euro

A Tragédia do Euro de Philipp Bagus


A posição neoliberal pura e dura. Na génese do Euro, segundo o autor, uma imposição francesa à Alemanha disfarçada de uma negociação política – apoio europeu à unificação em troca do fim do marco, substituído por uma moeda única.

Nesta narrativa os indisciplinados governantes do Sul viam no marco, no Budensbank e na sua estrita política monetária por um lado um perigo e por outro um exemplo que, fazendo sobressair por comparação a sua actuação incompetente, os envergonhava aos olhos dos seus próprios povos. Aproveitaram então a oportunidade da queda do muro de Berlim para exigirem o fim da moeda alemã.

O Euro é visto como uma forma de roubo à Alemanha. O Euro de acordo com o autor fomenta a inflação e os grandes beneficiários dessa inflação são os países do Sul à custa dos países do Norte, consumando-se dessa forma uma redistribuição de recursos injustificada. Essa é, para Bagus, a tragédia do Euro.

Os povos do Sul, menos produtivos, porque dispondo de menos capital para trabalhar (máquinas, instrumentos, ferramentas e organização), deveriam para continuar competitivos ir reduzindo os seus rendimentos. No entanto para manter artificialmente o seu nível de vida os Estados do Sul preferiram ir-se endividando, criando pressões inflacionistas na zona Euro.

Mais injusta de torna a situação, quando os países do Sul, entram em dificuldades de pagamento das dívidas contraídas obrigando os países do Norte a disponibilizar as verbas para os ajudar. De novo uma transferência de riqueza do Norte para o Sul sem que nada a suporte ou fundamente.

Uma perspectiva muito controversa e sem dúvida que cheia de contradições e omissões, mas uma explanação clara da visão alemã do problema do Euro.

Os Buddenbrook

Os Buddenbrook por Thomas Mann




A vida, os costumes, a forma de agir e pensar de várias gerações de uma rica família de comerciantes do Norte da Alemanha do seu apogeu à desaparição do último varão válido da linhagem.

Com uma obsessão pelo detalhe útil, o que revela uma realidade profunda e oculta, e pela descrição exacta, exaustiva e perspicaz, o autor pinta um retracto da burguesia comercial hanseática do século XIX. Num certo sentido Thomas Mann é a Jane Austeen alemã, tal é a nitidez dos cenários, das casas, do mobiliário, dos fatos, das pessoas e seus sentimentos e costumes. Mas o que na inglesa é leveza, alegria, vivacidade e critica bem-humorada surge em Mann envolto em seriedade, tristeza, infelicidade e tragédia.

Duas pulsões antagónicas pelejam pela alma dos personagens, de um lado a vida prática, saudável, espontânea do burguês comum, do outro a vida intelectual e artística com o seu pensamento reflexo e a sua sensibilidade estética. Á medida em que a segunda pulsão se vai insinuando no espírito dos Buddenbrook advém inexoravelmente a decadência e o fim surge como único desenlace possível.