O Delfim de José Cardoso Pires
O domínio secular de uma família sobre a
Lagoa, as terras e as gentes da Gafanha chega ao fim de uma maneira
simultaneamente dramática, para o Delfim, e surpreendente para todos.
Herdeiro estéril de uma linhagem de senhores semifeudais,
o Infante, apesar da sua fortuna, da sua autoconfiança e das suas maneiras
paternalistas, autoritárias, distantes e violentas de relacionamento com a
população e os criados, não consegue evitar a sua queda que chega de onde
menos se espera, do núcleo mais chegado.
Um personagem-chave é Domingos, o estóico e
pacifico cabo-verdiano que sem um braço e sem escolaridade, domina a mecânica automóvel
e outras artes, e se revela fundamental para a queda do Infante.
Pode ser interpretado como uma inteligente
metáfora aos últimos anos do fascismo em Portugal, na vigência de Marcelo
Caetano, ele próprio um delfim envelhecido de Salazar, e na previsão da queda do regime com base no problema colonial.
Narrado de uma forma distante e desapegada, o
livro contém interessantes reflexões sobre a realidade, como pode ser vista e
pressentida de vários ângulos e perspectivas, sobre a relação do caçador e da
caça, sobre a educação tal como era vista na época pelos poderes dominantes e
que ainda prevalece nas relações laborais em muitas empresas “os mandamentos de fazer o homem, os quais
foram ditados pela experiência dos antigos e são três, a saber: recompensa com
prudência, governo com vigilância e castigo com firmeza. Vinho por medida,
rédea curta e porrada na garupa”.
Do livro saiu um filme, em 2002, de Fernando
Lopes com Rogério Samora e Alexandra Lencastre.
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