segunda-feira, 3 de julho de 2017

A arma da casa



A arma da casa

O drama de um casal sul-africano branco cujo único filho, já adulto e independente, comete um assassinato, é preso, confessa e vai a julgamento já no período pós-apartheid.

Apesar de profissionais bem-sucedidos os pais do jovem adulto ficam desorientados, incapazes de num primeiro momento enfrentar a realidade e de lutar pelo filho, antes se deixando enredar num processo de identificação e atribuição de culpas, para só mais tarde se darem conta que a pena de morte ainda constituía uma probabilidade bem real.

O livro, numa cadência lenta, aborda múltiplos temas, desde a religião, o pai é católico e mãe há muito deixou de ser crente, ao racismo na sociedade, a culpa do virar da cara e nada fazer durante o regime da descriminação, passando pela homossexualidade, pelo suicídio, pelas difíceis relações entre Duncan e a namorada, pela amizade e pela imperfeita correspondência entre os meandros judiciais e a Justiça. Tudo escalpelizado, analisado em detalhe, visto por diferentes ângulos e perspectivas, para no final não se chegar a nenhuma conclusão definitiva.

Duncan é culpado ou vitima das circunstâncias? Que Justiça pode um morto esperar? Perante uma sociedade cruelmente injusta é legítimo olhar para o lado e prosseguir a vida como se nada fosse? Que deveres contraí quem salva a vida de outrem e que obrigações pesam sobre os ombros de quem é salvo? Ajudar quem não quer ser ajudado é ajudar? É possível mudar alguém? Nos tribunais a forma sobrepõem-se ao conteúdo ou é apenas uma maneira de o realçar?

Nadine Gordimer, uma das escritoras sul-africanas mais ativas na luta contra o segregacionismo, recebeu o Prémio Nobel em 1991 o mesmo ano em que o odioso regime do apartheid caiu e o ANC a que pertencia, e que durante décadas foi classificado pelas potências ocidentais como movimento terrorista, subiu ao poder. Foi amiga próxima de Nelson Mandela.

A Arma da Casa, publicado em 1998, carrega já a carga da responsabilidade que se abate sobre os escritores laureados. 

Gordimer continuou a escrever até 2005. Morreu na sua cidade natal, Joanesburgo, em 2014.






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