Djidiu – A Herança do Ouvido
Uma colectânea de poetas em que se escreve
sobre temas de grande importância como a identidade, o racismo, a consciência
negra, os padrões de beleza, a educação, a família, o amor, a apropriação
cultural e tantos outros.
Resultante de um projeto artístico que se
desenvolveu ao longo do ano de 2016 e que reuniu mensalmente para declamação e
partilha os poetas envolvidos no coletivo Djidiu – “palavra de origem mandinga”
que designa “um contador de histórias, um recipiente e um difusor da memória
coletiva”.
Aqui despontam poetas de grande sensibilidade
e qualidade formal fortemente empenhados num movimento artístico moderno, de
matriz urbana, de assunção, defesa e orgulho na consciência negra e de
reaproximação com África.
Poemas como Minha Pele de Carlos Graça ou Amigalhaços
de Cristina Carlos refletem sobre o que é ser negro numa sociedade
estruturalmente racista como a portuguesa – “Ri bem alto como só vocês sabem
fazer. / Ri quando te chamo macaca! / Ri quando te chamo estúpida! / Se queres
pertencer, ri!”.
Destaque também para Carla Lima, Danilson
Pires, Dário Sambo, autores a seguir com atenção.
Apolo de Carvalho é um dos casos mais sérios
deste movimento. As suas poesias quer em português quer em Língua Cabo-verdiana
são belos e comoventes hinos à unidade e de esperança numa pujante renascença dos
povos africanos. O seu poema Há Quanto Tempo termina com uma certeza “E a nossa
amada Mãe Negra erguer-se-á esplendorosa / HOTEP”.
Num tom mais intimista a poesia de luZGomes
aborda a questão do corpo “Quero um novembro negro de amor… Quero um novembro
negro sem dor …Quero um novembro de calor …”.
Uma das poesias mais comoventes é sem dúvida
a de Cristina Carlos “Outra Educação” de que aqui deixo um excerto:
“A quem me posso queixar?
Se não sou caso de estudo, não existo!
Volto para o recreio a brincar ao que não quero – Não conto!
Se não sou caso de estudo, não existo!
Volto para o recreio a brincar ao que não quero – Não conto!
Não quero ser o macaco Adriano, pai!
Porque não posso ser a princesa, mãe?
Não ligues filha! Estuda! Quando fores doutora
ninguém goza contigo!
Fala português filha! Nem os angolanos da
banda falam kimbundo.
Professor, ele chamou-me nomes! Porque te
cansas Maria?
Pra empregada doméstica não precisas de mais …
Foste tu que escreveste isto?!! – Preto não
escreve assim! Prova que não copiaste! Prova que consegues!
Repete! Faz oral!
Pronto toma menos dois pontos!
Pronto toma menos dois pontos!
E Eu /TU sempre a sorrir!
Eu /TU sem se queixar porque afinal de contas… Em Portugal não há e nunca houve racismo.
Eu /TU sem se queixar porque afinal de contas… Em Portugal não há e nunca houve racismo.
E o que dizer se aprendi tão bem o “S” do
silêncio …”
Carla Fernandes em “Dupla Consciência” fala-nos
de uma “consciência mutilada” e da dificuldade de sair desse ciclo de falsa
apreensão da história e da identidade.
Grande qualidade e originalidade na poesia de
Té Abipiquerest Té. Gostei particularmente de “Carta e um emigrante Pontuado com
um Grão de Lágrima”. Um dos melhores desta colectânea.
Este livro corresponde de algum modo à
primeira apresentação para um público mais vasto de um movimento cultural
nascente que seguramente se consolidará nos próximos tempos e deixará marcas profundas
na sociedade portuguesa. Imprescindível.
Vou gostar de ler este livro. Conheço bons poetas guineenses de outras épocas como J.C. Schwartz. Vou ao lançamento no Museu do Aljube.
ResponderEliminarcredacQna-be Real Breeze Crack
ResponderEliminarrepiverla