Tanta gente Mariana por Maria Judite
Carvalho
Uma novela e sete contos reunidos sob o
título da novela, juntos também por uma sofrida temática feminista.
Contos sobre mulheres portuguesas dos anos 50
do século XX escritos por uma mulher da época. De certa forma datados, mas que
nos transmitem uma imagem “fiel e verdadeira” do universo feminino da classe
média em Portugal. Aqui vemos a mulher que já trabalha mas acantonada em
profissões específicas, a modéstia dos rendimentos se sozinha, modéstia que,
contudo, sempre possibilitando a contratação de pelo menos uma criada interna.
A mulher sofrida, incompreendida, solitária,
doente, sem energia para lutar pelos seus sonhos, que aceita a sua condição
subalterna em relação ao homem, que se curva ao destino sem luta nem esperança.
A mulher fatalista, triste e amargurada.
Em Tanta Gente Mariana, contado na primeira
pessoa, temos uma personagem doente, desenganada pelos médicos que se sente “Mole. E enjoada comigo própria como se me
tivesse provado. Um pedaço de pão que depois de se mastigar durante muito tempo
acabasse sabendo mal. Sabendo a mim própria, aos meus próprios sucos. Cuspi-me
com desagrado para cima da cama e aqui fiquei líquida e espapaçada. É um estado
de espírito entre calmo e desesperado com uma leve ansiedade à mistura.”
Vive num quarto, trabalha num escritório
lisboeta, vai definhando sem dinheiro para os tratamentos enquanto faz o
balanço da sua curta vida. Recorda o casamento, o divórcio, o filho que não
nasceu e concluiu que “nunca soube estar.
Escolhi sempre mal as ocasiões para falar e para ficar calada. Troquei tudo,
baralhei todas as coisas a ponto de me não achar a mim própria”.
Em A Avó Cândida perpassa toda uma ironia,
até no nome da velha senhora, sobre a hipocrisia moral da época. Em A Mãe temos
de novo o espartilho conservador que leva uma mulher enganada a suicidar-se
como forma de resistência. A Noite de Natal fala-nos do alcoolismo, da
violência doméstica, e dos remorsos extremados.
O Passeio de Domingo centra-se num homem que,
contudo, segue o mesmo perfil psicológico de abdicação dos sonhos. É um homem é
uma metáfora para a Mulher.
Maria Judite Carvalho (1921-1998) é uma das
principais escritoras portuguesas do século XX. Estranhamente esquecida.
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