quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

Identidades


Identidades por Francis Fukuyama

Como definimos a nossa identidade? Sobre valores e experiências partilháveis ou sobre experiências vividas, não partilháveis este é o dilema que Fukuyama apresenta e que pensa ser o problema central da política atual e da emergência da extrema-direita apelidada de populista.

Uma certa esquerda, a partir dos anos 70, pensando erradamente estar numa sociedade de bem-estar geral, pós-capitalista e pós-moderna, alienou a sua base trabalhadora e entrincheirou-se exclusivamente na defesa dos direitos de minorias étnicas, de género (movimento LGBT) perdendo de vista as causas profundas da discriminação destes grupos.

Foi uma solução útil porque lhe permitiu alinhar-se com as classes dominantes já que os direitos que defendia para as minorias não implicavam qualquer cedência económica e, na verdade, esses direitos foram conquistados, muitas vezes, a troco de cedências económicas ao patronato.

Veja-se a evolução a partir dos anos 80 em Portugal nas políticas conduzidas pelo PS e BE. Nesse ponto concordamos com Fukuyama quando escreve “muita da esquerda parou de pensar há várias décadas sobre políticas sociais ambiciosas que pudessem ajudar a remediar as condições de base dos pobres. Era mais fácil falar de respeito e dignidade do que apresentar planos potencialmente dispendiosos que reduzissem concretamente a desigualdade”.

Também concordamos com Fukuyama quando afirma que “a diversidade não pode ser uma base de identidade por si só e em si mesma”. Uma nação, para sobreviver como sociedade coesa tem de ter uma identidade que agregue as pessoas com diversas identidades étnicas, religiosas, de género, linguísticas ou outras. Sem esse chapéu agregador a sociedade tende a atomizar-se e a permitir o domínio do grupo economicamente mais forte.

Concordamos igualmente que esse cimento agregador, essa identidade coletiva, deve ter uma base “doutrinal” e ser “socialmente construído” e não ter por base a etnia, a religião o género ou a língua.

Obviamente discordo da “doutrina”, a doutrina da democracia liberal norte-americana, que propõe como agregadora. Aqui Fukuyama cego pela ideologia não vê que foi essa doutrina que criou a atual situação de fragmentação que como ele próprio refere está na base do populismo de extrema-direita. Outra doutrina é necessária.

Fukuyama, contudo, põe o mundo às avessas e adota uma visão idealista do mundo, em que são as ideias a moldar a realidade e não o contrário. De facto a fragmentação das identidades, a deriva de uma certa esquerda, são consequências e não causas. São consequências da dominação mundial das multinacionais, da mundialização económica e do seu sistema neoliberal imposto à maioria dos países e que implica a desregulamentação financeira, económica, laboral e cultural. Os Estados mais frágeis entraram em colapso e tornaram-se estados falhados com a ajuda de intervenções externas. A ideologia da fragmentação das identidades é fruto deste novo estádio de desenvolvimento económico e social.

Por outro lado essa fragmentação tem uma base material. É inegável o racismo, a desigualdade de género, a luta pela igualdade da comunidade LGBT, a luta pelo reconhecimento das línguas e culturas minoritárias. O que é necessário não é suprimir essas lutas, mas sim integra-las numa identidade mais vasta assente em princípios e valores de justiça, igualdade e numa doutrina de libertação da Humanidade.

Francis Fukuyama, é um cientista político norte-americano, muito alinhado com a política externa norte-americana, e que se celebrizou com a sua obra de 1989, O Fim da História em que defendeu que a Humanidade tinha chegado ao seu último estádio, a democracia liberal, e que para ela não haveria qualquer alternativa.

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