quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Breve História do Futuro


Jacques Atalli pretendeu com esta obra erguer-se ao nível de Karl Marx. Ele próprio o diz textualmente “ Marx detectara os futuros actores da História antes ainda de estes existirem. Essa é a tarefa que se nos coloca nos nossos dias” (pag 245). Mas claramente não está à altura da tarefa a que se propõe. Mas esse propósito ajuda a compreender o livro, a sua estrutura e as sua mecânica.

Marx estudou a História e elaborou uma nova metodologia de abordagem histórica, assente no materialismo dialéctico. Marx sugeriu uma periodificação baseada nos sucessivos modelos de relações de classes sociais (feudalismo, capitalismo, etc.).

Atalli tem também uma periodificação histórica, mas detém-se com maior detalhe no período actual que denomina de Ordem Mercantil.

Apresentada a sua perspectiva da História, Atalli entra na antecipação da evolução da Ordem Mercantil, e finalmente aponta como será superada por uma nova sociedade.

A sua antecipação do futuro é uma simples caricatura em tons mais carregados das misérias do presente. O caos mundial, a desagregação dos Estados, o triunfo do liberalismo selvagem, do egoísmo, a ainda maior assimetria social. Cai o hiperimpério e sucedem-se os conflitos, entra-se no tempo do Hiperconflito.

A técnica é simples: acrescentar o prefixo hiper a todos os defeitos do presente. Existem conflitos? O Futuro será a época do Hiperconflito. Existe hoje uma malsã vigilância do Estado sobre os cidadãos? O Futuro será a era da hipervigilância. No fundo, apenas e truques linguisticos sem conteúdo tanto ao gosto da intelectualidade francesa.

Mas o mais interessante é a forma como Atalli vê o cenário alternativo, em que o Bem vence. A redenção chega pela mão dos transumanos, que se servirão de empresas relacionais para salvar o Mundo!! Estes seres implementaram então por todo o globo uma nova ordem, a hiperdemocracia!!.

E quem são estes seres que nos vão salvar? Atalli exemplifica: “Entre os transumanos dos nossos dias poderíamos citar tanto Melinda Gates ...”. A mulher do homem mais rico da terra é o exemplo dos líderes de amanhã, dos seres trasumanos que implementarão a hiperdemocracia. A uma democracia destas chama-se plutocracia.

Inacreditável. Claramente já não estamos numa análise social ou histórica, ou numa tentativa séria previsão. Quão longe do rigor da análise de Marx.

Attali retira então conclusões para o seu país, e propõe receitas práticas a implementar de imediato pelo Presidente francês: “ ... durante os cinco anos do seu mandato, reduza as despesas do Estado em pelo menos 10% por ano, e que aumente os impostos pelo menos 5% por ano.” E como o fazer? Através do “combate ao despesismo nas administrações militares, fiscais e sociais, redução substancial dos subsídios atribuídos à agricultura e a industrias...”. Tanta coisa para propor a típica receita neo-liberal de redução do Estado.

No último capitulo Atalli escreve sobre Portugal. A última frase é profética “O país terá de dar sequência a este esforço, melhorando a qualidade do ensino superior e desenvolvendo a formação profissional, se quiser obter taxas de crescimento anual superiores a 2% depois de 2008”. O Banco de Portugal acaba de publicar as previsões de crescimento para 2009. Teremos um decréscimo de 0,8%!

Ainda a tinta deste livro, publicado em França em 2006, não tinha secado e o futuro segue já outro rumo. Uma enorme crise económica abate-se sobre o mundo pondo em causa o liberalismo selvagem e levando os Estados a intervir de forma massiva, pondo de lado os dogmas de abstenção das últimas décadas. A solução preconizada por Atalli para a França foi já deitada ao caixote do lixo por Sarkozy e pelos planos de aumentar a despesa, o investimento e a dívida pública para salvar a economia francesa. Quem não consegue antecipar a um ano de vista como poderá tentar vender os seus dotes de previsão a longo prazo?

Este livro é uma desilusão.

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