Ravelstein por Saul Bellow
Bonecas, dentro de bonecas, dentro de bonecas numa regressão
sem fim, as matrioshkas, as coloridas bonecas de madeira russas, são a imagem perfeita
de uma viagem até ao âmago de uma questão ou problema.
Conhecer os outros pressupõe que nos entendamos a nós
próprios, escrever a biografia de alguém implica expor muito de nós próprios. Mais
ainda se biografo e biografado tiverem partilhado a mesma herança cultural e
religiosa, sido colega no trabalho, amigo e confidente na vida privada. Nesses
casos biografia e autobiografia entrelaçam-se sem que seja possível desenredar
os fios multiplamente cruzados.
Como explicar o que vai no íntimo de outrem quando a morte é
certa, quando o fim se aproxima, sem o ter vivenciado, sem o ter experimentado.
Compreender o outro não é a vazia e superficial empatia de quem se coloca
imaginariamente em pele alheia, mas, num nível mais profundo a comunhão de
experiências, ter passado pelo mesmo, ter estado lá.
Saul Bellow conta-nos, neste extraordinário romance com
chave, o último capítulo da história da sua amizade com o filósofo Allan Bloon
o autor do muito celebrado “O fechar da mente americana” livro que lhe trouxe
fama e fortuna e cuja introdução foi assinada pelo próprio Bellow.
Muitas ideias filosóficas de Bloom, que o autor recusa
expressamente abordar, regressam pela porta do cavalo e são discutidas através
de pequenos episódios da vida quotidiana que as confirmam ou refutam.
Sem comentários:
Enviar um comentário